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    Pleno poder em nossas Fraquezas – J. I. Packer



    O Poder de Deus se Revela de Forma Muito Mais Plena nas Fraquezas Humanas

    Existem muitos tipos de fraquezas. Há a fraqueza física do deficiente físico; há a fraqueza de caráter da pessoa que age enganosamente ou em vícios; há a fraqueza intelectual da pessoa com capacidades limitadas; há a fraqueza resultante da exaustão, depressão, pressão, marcas e sobrecargas emocionais. Deus santifica todas estas formas de fraquezas ao capacitar o fraco para que seja mais forte (mais paciente, relacionai, afetuoso, tranqüilo, alegre e equilibrado) do que parecia ser possível diante das circunstâncias. Este é uma demonstração do seu poder que ele tem prazer em dar.

    Paulo declara este princípio nas palavras a seguir: "Temos, porém, este tesouro em vasos de barro, para que a excelência do poder seja de Deus e não de nós. Em tudo somos atribulados, porém não angustiados; perplexos, porém não desanimados; perseguidos, porém não desamparados; abatidos, porém não destruídos; levando sempre no corpo o morrer de Jesus, para que também a sua vida se manifeste em nosso corpo. Porque nós, que vivemos, somos sempre entregues à morte por causa de Jesus, para que também a vida de Jesus se manifeste em nossa carne mortal. De modo que, em nós, opera a morte, mas, em vós, a vida" (2Co 4.7-12). Em um mundo como o nosso, dominado pelo egocentrismo, comodismo e orientado à busca do prazer, as palavras do apóstolo soam dissonantes e brutais. Mas elas conduzem, no entanto, o verdadeiro sentido de um ditado popular muito conhecido e respeitado que diz: "O extremo humano é a oportunidade de Deus". Oportunidade para quê? - para mostrar o seu poder, o poder de sua graça, agora manifestado para o louvor de sua glória.


    Ser fraco, ou sentir-se fraco, não é em si algo engraçado, nem pode ser uma condição do que o mundo veria como a máxima eficiência. É possível que se espere que Deus use o seu poder para eliminar essa fraqueza da vida dos seus servos. Entretanto, o que ele, de fato, repetidamente faz é conduzir os seus servos às maravilhas não fixas - às vezes, sem dúvida, no sentido físico, maravilhas imobilizadas - de sabedoria, amor e ajuda aos outros, apesar de suas limitações. É desta maneira que o amor mostra o seu poder. Esta é uma verdade vital que deve ser aprendida.

    O próprio Paulo aprendeu toda esta lição pelo seu relacionamento com os cristãos de Corinto. Paulo não era um homem de meia medida ou de relacionamentos mornos. Ele era, naturalmente, uma "bola de fogo", como dissemos, dominador, combativo, brilhante e apaixonado. Consciente de sua autoridade apostólica e bem certo de que seu ensino era definitivo e saudável, ele se envolveu completamente na tarefa de discipular os seus convertidos. Ele sentia e expressava grande afeição por eles, porque eram de Cristo, e, naturalmente, esperava, não somente obediência, mas também afeição da parte deles.

    No entanto, no caso dos coríntios, a obediência não era praticada, nem a afeição era muito sentida. Isto aconteceu, em parte, pelo fato de Paulo não ter alcançado as expectativas intelectuais deles (como Paulo ilustra em suas duas cartas), levando-o, então, a ser desrespeitado. Paulo, na verdade, não os tinha impressionado como mestre. Aconteceu também, pelo fato de outros mestres, cuja argumentação filosófica os tinha impressionado, terem conquistado o respeito e a lealdade deles. Por fim, isto também aconteceu pelo fato de os coríntios terem adotado uma visão triunfalista da vida espiritual, que valorizava o falar em línguas e o exibicionismo, em detrimento do amor, humildade e justiça. Eles entendiam que o cristão era uma pessoa liberta por Cristo para fazer qualquer coisa que desejasse, sem consideração alguma pelas conseqüências. Eles viam o apóstolo Paulo como uma pessoa "fraca" - cuja presença e discurso não impressionavam (2Co 10.10) e, possivelmente, equivocado em questões doutrinárias e morais. Eles eram muito críticos do estilo pessoal e atitudes de Paulo.

    Qualquer pessoa que estivesse na posição de Paulo sentiria a mesma dor que ele sentiu. Ao lermos suas cartas aos Coríntios, podemos perceber suas expressões de amor angustiado e suas manifestações de dor, ira, desapontamento, frustração e sarcasmo. Tudo isto foi muito difícil para ele. Entretanto, sua resposta foi magnífica. Ele assumiu a sua fraqueza - não a fraqueza de ministério que os coríntios alegavam, mas a de um corpo enfermo, da função de servo e de um coração ferido - como seu chamado na terra. Ele diz: "Se tenho de gloriar-me, gloriar-me-ei no que diz respeito à minha fraqueza" (2Co 11.30). "De tal coisa me gloriarei; não, porém, de mim mesmo, salvo nas minhas fraquezas" (2Co 12.5). E, então, anunciou para o mundo:

    E, para que não me ensoberbecesse com a grandeza das revelações, foi-me posto um espinho na carne, mensageiro de Satanás, para me esbofetear, a fim de que não me exalte. Por causa disto, três vezes pedi ao Senhor que o afastasse de mim. Então, ele me disse: A minha graça te basta, porque o poder se aperfeiçoa na fraqueza. De boa vontade, pois, mais me gloriarei nas fraquezas, para que sobre mim repouse o poder de Cristo. Pelo que sinto prazer nas fraquezas, nas injúrias, nas necessidades, nas perseguições, nas angústias, por amor de Cristo. Porque, quando sou fraco, então, é que sou forte. (2Co 12.7-10)

    Que espinho ele tinha? Não sabemos. Mas deve ter sido um defeito pessoal, algum mal funcionamento de sua estrutura, ou ele não teria dito que o mesmo se encontrava na sua "carne" (no sentido de sua natureza humana criada). E tal experiência deve ter sido muito dolorosa, ou ele não a teria chamado de "espinho".

    Qual o propósito deste "espinho" (dado por Deus, na providência)? Ele foi dado para disciplina, como o próprio apóstolo reconheceu, para mantê-lo humilde - o que não é uma tarefa fácil quando o homem tem um ego imenso como o de Paulo.

    Em que sentido esse espinho era um mensageiro de Satanás? Ele despertou pensamentos de ressentimento para com Deus, autocomiseração e desespero em relação ao futuro de seu próprio ministério - o tipo de pensamento que Satanás é especialista em instigar dentro de todos nós. Qualquer coisa que induza a este pensamento torna-se um mensageiro de Satanás para a nossa alma.

    Por que Paulo ora especificamente ao Senhor Jesus sobre seu espinho? Porque Jesus era o curador, que havia realizado muitas curas milagrosas enquanto homem e algumas por intermédio de Paulo durante os anos do seu ministério missionário (At 14.3,8-10; 19.11). Agora, ele necessitava do poder curador de Jesus para si mesmo, o que buscou em três ocasiões diferentes.

    Por que ele não recebeu a cura? Certamente que não foi por falta de um coração puro e de uma oração sincera por parte de Paulo, nem por faltar poder em Jesus para executar o milagre, mas porque o Salvador tinha algo melhor para o seu servo (Deus sempre se reserva no direito de nos responder nossos pedidos de uma maneira melhor do que pedimos). Podemos, em outras palavras, expressar a resposta de Jesus à oração de Paulo da maneira seguinte: "Paulo, eu vou lhe dizer o que pretendo fazer. Mostrarei o meu poder nas suas fraquezas, de tal maneira que as coisas que lhe perturbam o fim ou ineficiência do seu ministério e a perda de sua credibilidade e utilidade - não ocorrerão. Seu ministério continuará no mesmo poder e força de antes, embora a fraqueza seja maior. Este espinho permanecerá na sua carne por toda a sua vida. Mas, apesar de esta condição de fraqueza, meu poder será aperfeiçoado. Ficará mais claro do que nunca que sou eu quem o sustenta". A implicação era que, por meio de sua experiência, Paulo seria mais abençoado pessoalmente. Seria um ministério ainda mais enriquecido e glorificaria ainda mais a Cristo do que se a cura imediata tivesse acontecido.

    O que devemos aprender com as reações de Paulo? Ele claramente entendeu e aceitou o que Cristo lhe tinha comunicado ao responder à sua oração. Ele viu a resposta divina como a definição de sua própria vocação. E natural que imagine¬mos que uma das razões para ele ter narrado sua experiência com tantos detalhes foi a de que seria usado como modelo para muitos outros cristãos. Sua experiência é, certamente, um modelo que, freqüentemente, na nossa vida diária, somos chamados a imitar.

    O padrão aqui é que o Senhor primeiramente nos conscientiza das nossas fraquezas para que clamemos, do fundo do nosso coração: "eu não agüento isto". Nós nos voltamos para o Senhor e lhe pedimos para retirar da nossa vida o jugo que sentimos estar nos pressionando. Mas Cristo diz: "Com o meu poder, você pode suportar isto, e, em resposta à sua oração, irei fortalecê-lo". Assim, ao final, o nosso testemunho será como o de Paulo, quando disse: "Tudo posso naquele que me fortalece" (Fp 4.13); "Mas o Senhor me assistiu e me revestiu de forças" (2Tm 4.17). E nos surpreendemos dizendo: "Bendito seja o Deus e Pai de nosso Senhor Jesus Cristo, o Pai de misericórdias e Deus de toda consolação! É ele que nos conforta em toda a nossa tribulação, para podermos consolar os que estiverem em qualquer angústia, com a consolação com que nós mesmos somos contemplados por Deus. Porque assim como os sofrimentos de Cristo se manifestam em grade medida a nosso favor, assim também a nossa consolação transborda por meio de Cristo" (2Co 1.3-5).

    Por "conforto", Paulo quer dizer o encorajamento que revigora, e não o relaxamento que enerva. E neste sentido que nos alegramos em testemunhar o con¬forto divino. Nós nos achamos vivendo (se é que posso colocar desta forma) em termos batismais, com a ressurreição dos mortos tornando-se a forma comum de nossa experiência. E, com uma iluminação sempre crescente, entendemos que esta é a expressão mais completa e profunda de uma vida cristã cheia de poder.

    Parece, então, que o ser cheio do poder de Deus, de tal maneira que possamos nos fortalecer ainda mais em Cristo, nada tem a ver, necessariamente, com obras majestosas e bem-sucedidas, de acordo com os padrões humanos, pois somente Deus pode decidir a respeito da validade eterna do que fazemos. Tem tudo a ver, no entanto, com o reconhecimento e sentimento de nossa fraqueza. Neste sentido, somente crescemos em força, se crescermos em fraqueza. O significado que o mundo dá ao conceito de força (de caráter, mente e vontade) indica uma habilidade natural para pressionar sempre para a frente, sempre focalizado e nunca desencorajado, na busca do seu alvo. A força ou poder dado por Deus, por outro lado, é uma questão de estar capacitado pelo próprio Cristo, por intermédio do Espírito, para manter-se em:

            santidade pessoal diante de Deus;

            comunhão pessoal com Deus;

            serviço pessoal a Deus; e

            ação pessoal para Deus.

    Neste entendimento, o cristão se mantém firme, não importando o quanto se sinta fraco. Ele se mantém firme mesmo em situações nas quais se exige dele mais do que pode dar, só porque confia que tal situação acontece de acordo com o que Deus deseja. Ele descobre que o fortalecimento divino só começa quando a pessoa encara, sente e admite a insuficiência de suas próprias forças.

    Portanto, o caminho do poder é a dependência humilde de Deus para que ele canalize seu poder até às profundezas do nosso ser e, assim, nos faça e mantenha fiéis ao nosso chamado de santidade e serviço. Dependemos dele para canalizar o seu poder por nosso intermédio, visando alcançar as outras pessoas em seus pontos de necessidade. A maior armadilha do poder é a autoconfiança e falta de percepção para ver que, sem Cristo, nada podemos fazer que seja espiritualmente significativo em termos de atividade energética, embora possamos fazer muitas coisas em termos quantitativos. O princípio do poder - o cenário do poder de Deus - é que a força divina é aperfeiçoada na fraqueza humana consciente. As perversões do poder levam-nos a imaginar que o poder de Deus é algo que possuímos e controlamos, ou que podemos pedir-lhe que nos encha de poder para a obra, mesmo quando não lhe pedimos para nos dar poder a fim de que vivamos uma vida de santidade. Tais perversões de entendimento são, no entanto, completamente erradas.

    Se eu pudesse relembrar, a cada dia da minha vida, que só cresço em força, quando cresço em fraqueza; se eu pudesse aceitar que as frustrações, obstáculos e acidentes do meu dia-a-dia são maneiras que Deus usa para levar-me a reconhecer minhas fraquezas; então, o crescimento em poder se tornaria uma possibilidade para mim, desde que eu não traísse a mim mesmo ao passar a confiar em mim mesmo - no meu conhecimento, habilidade, posição, retórica, e assim por diante - na maior parte do tempo, que diferença isto faria para mim!

    Fico a me perguntar quantas outras pessoas, além de mim mesmo, precisam se concentrar em aprender estas lições? Se você leu o livro até este ponto, peço que faça uma pausa e perguntar a si mesmo o quanto estas verdades estão firmemente estabelecidas em seu coração. Elas precisam estar ancoradas ali com muita firmeza de fato, e temo que, no coração de muitos cristãos de hoje, elas não estejam. Que Deus, em sua grande misericórdia, enfraqueça todos nós!