O pecado não somente
separa; ele escraviza. Além de nos afastar de Deus, ele também nos mantém
cativos.
Consideraremos agora a
"internalidade" do pecado. Mais do que uma atitude ou hábito visível,
o pecado revela uma profunda e arraigada corrupção em nosso interior. Na verdade,
os pecados que cometemos são manifestações exteriores e visíveis de uma
enfermidade interior e invisível, são os sintomas de uma doença moral. Jesus
empregou a metáfora da árvore e seus frutos para explicá-lo. Ele disse que o
tipo de fruto produzido pela árvore (uma figueira ou videira) e sua condição
(boa ou má) dependem da natureza e da saúde da árvore. Da mesma forma, "a
boca fala do que está cheio o coração".
Essa declaração de
Jesus contradiz muitos reformadores e revolucionários sociais modernos.
Certamente a maneira como fomos
educados, o ambiente em que fomos criados, o sistema político e económico sob o
qual vivemos exercem uma influência (boa ou má) sobre nós. Além do mais, deveríamos
lutar por justiça, liberdade e pelo bem-estar de todos os homens. Entretanto, Jesus
não atribuiu a nenhuma dessas coisas os males da sociedade humana, e sim à
própria natureza, ou "coração", do homem. Vejamos o que ele diz:
Porque
de dentro, do coração dos homens é que procedem os maus desígnios, a
prostituição, os furtos, os homicídios, os adultérios, a avareza, as malícias,
o dolo, a lascívia, a inveja, a blasfémia, a soberba, a loucura. Ora, todos
estes males vêm de dentro e contaminam o homem.
O Antigo Testamento já
ensinava essa verdade. Como coloca Jeremias: "Enganoso é o coração, mais
do que todas as coisas, e desesperadamente corrupto, quem o conhecerá?" A
Bíblia está repleta de referências a essa infecção da natureza humana que
chamamos de "pecado original". Trata-se de uma tendência ou
predisposição egoísta, que herdamos de nossos pais, e que está profundamente
arraigada em nossa personalidade humana e se manifesta milhares de vezes, de
maneira repulsiva. Paulo chamou-a de "carne",
e nos deixou uma lista de suas "obras", ou consequências.
Ora,
as obras da carne são conhecidas, e são: prostituição, impureza, lascívia,
idolatria, feitiçarias, inimizades, porfias, ciúmes, iras, discórdias,
dissensões, facções, invejas, bebedices, glutonarias e coisas semelhantes a
estas.
Como o pecado é uma
corrupção interna da natureza humana, ele nos mantém escravizados. Não são
alguns atos ou hábitos que nos escravizam, mas sim a infecção maligna de onde
eles procedem. Muitas vezes, no Novo Testamento, somos descritos como "escravos". Podemos nos ofender com isso, mas é a pura
verdade. Jesus provocou a indignação de certos fariseus quando disse a eles:
"Se
vós permanecerdes na minha palavra, sois verdadeiramente meus discípulos; e
conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará".
Eles
retrucaram: "Somos descendência de Abraão e jamais fomos escravos de
alguém; como dizes tu: Sereis livres?"
Jesus
respondeu: "Em verdade, em verdade vos digo: Todo o que comete pecado é
escravo do pecado".
Por
várias vezes, em suas epístolas, Paulo descreve a servidão humilhante imposta a
nós pelo pecado:
Porque,
outrora escravos do pecado...
Entre
os quais nós também todos nós andamos outrora, segundo as inclinações da nossa
carne, fazendo a vontade da carne e dos pensamentos.
Pois
nós também, outrora, éramos néscios, desobedientes, desgarrados, escravos de toda
sorte de paixões e prazeres.
Tiago nos dá um exemplo
de nossa falta de autocontrole quando menciona a dificuldade que temos em
refrear a língua. Em um capítulo bastante conhecido, repleto de metáforas, ele
diz que se alguém "não tropeça no falar, é perfeito varão, capaz de
refrear também todo o seu corpo". Ele destaca que "a língua, pequeno órgão, se gaba de grandes coisas". A sua
influência se espalha como o fogo; ela é "mundo de iniquidade" e está
carregada de "veneno mortífero". Podemos domar todos os tipos de
feras e pássaros, ele acrescenta, "a língua, porém, ninguém consegue
domar".
Sabemos disso muito
bem. Todos nós temos ideais elevados, mas vontade fraca. Queremos viver uma
vida abnegada, mas estamos acorrentados ao nosso egoísmo. Embora possamos nos
gabar de que somos livres, na realidade não somos outra coisa senão escravos.
Devemos nos aproximar de Deus com lágrimas e dizer:
Não posso, Senhor,
não há nada que eu
possa fazer,
nenhuma batalha em
minha vida
que eu possa realmente
vencer.
Mas agora venho lhe
dizer
o quanto eu lutei e
falhei,
em minha história tão
humana
de fraquezas e
futilidades.
Regras de conduta não
resolvem o nosso problema; não podemos cumpri-las. Mesmo que Deus nos diga
claramente para não fazer alguma coisa, continuaremos fazendo até o final dos
tempos.
Sermões também não
adiantam; o que nós precisamos é de um Salvador. Mudar nossa mente através da
educação não é suficiente, precisamos de uma mudança de coração. O homem
descobriu o segredo da força física e o poder da reação nuclear. Agora ele
precisa do poder espiritual para libertar-se de si mesmo e ajudá-lo a
conquistar e controlar o seu eu; um poder que dê a ele um caráter moral à
altura de suas conquistas científicas.