O amor eletivo de Deus. "E aos que predestinou, a esses também chamou" (Rm 8.30). A eleição é a causa originária de nossa vocação. Ele não vocaciona alguns para esse chamado celestial porque são mais valorosos que outros, visto que estamos todos em nosso sangue (Ez 16.6). Que valor há em nós? Que valor havia em Maria Madalena, de quem foram expulsos sete demônios? Que valor havia nos coríntios quando Deus começou a chamá-los por seu evangelho? Eram fornicadores, efeminados, idolatras. "Tais fostes alguns de vós; mas vós vos lavastes" (ICo 6.11). Antes da vocação eficaz não éramos somente pessoas "fracas" (Rm 5.6), mas "inimigos" de Deus (Cl 1.21).
A base da vocação é a eleição.
Quais são as qualificações dessa vocação?
i. A vocação eficaz é um chamado poderoso. "As palavras de Deus são obras", disse Lutero. Deus, ao chamar um pecador a si mesmo, exercita um infinito poder. Ele não somente se utiliza de sua voz, mas também de seu braço. O apóstolo fala da suprema grandeza de seu poder, que ele exercita para com aqueles que crêem (Ef 1.19). Deus cavalga conquistando na carruagem de seu evangelho. Ele conquista o orgulhoso de coração. Ele muda a vontade, mesmo encastelada em uma muralha fortificada, de modo que ela ceda lugar ese submeta à sua graça. Ele faz o coração de pedra sangrar. Quão poderosa é essa vocação.
Por que, então, os arminianos falam sobre uma persuasão moral, na qual Deus, ao converter um pecador, só persuade moralmente e nada mais? Seria o caso em que Deus apresentaria suas promessas aos homens para instigá-los ao bem, ao passo que suas ameaças servissem apenas para detê-los de fazer o mal, seria somente isso? As persuasões morais sozinhas não são suficientes para uma vocação eficaz. Como a proposição pura das promessas e das ameaças pode converter uma alma? Isto não acrescenta nada ao novo nascimento nem ao poder que ressuscitou Cristo da morte. Deus não somente persuade, mas também capacita (Ez 36.27).
Se a conversão fosse somente persuadir moralmente, isto é, apresentar o bem e o mal diante dos homens, então Deus não usaria tanto poder para salvar os homens nem o diabo o usaria para destruí-los. Satanás não somente apresenta a tentação diante dos homens, mas coopera com suas tentações. Por isso, diz-se dele que "atua nos filhos da desobediência" (Ef 2.2). "A palavra grega para atuar significa imperar", disse Camerário.85 Esse é o poder que Satanás tem para levar homens ao pecado. Então, o poder de Deus na conversão não deveria ser mais que o de Satanás na sedução? A vocação eficaz é grande e poderosa. Deus atua com uma energia divina, ou melhor, com um tipo de onipotência. É uma vocação poderosa a tal ponto que a vontade do homem não tem poder suficiente para resistir.
ii. A vocação eficaz é um chamado superior. "Prossigo para o alvo, para o prêmio da soberana vocação de Deus" (Fp 3.14). É um chamado superior, primeiramente porque somos chamados a exercícios superiores da vida cristã: ser crucificado para o mundo, viver pela fé, fazer trabalho de anjos, amar a Deus, ser membros vivos de seu louvor, manter comunhão com o Pai e com o Filho (1Jo 1.3).
Além disso, é um chamado superior porque somos chamados a altos privilégios: adoção e justificação; para sermos reis e sacerdotes para com Deus. Somos chamados à comunhão dos anjos, para sermos co-herdeiros com Cristo (Hb 12.22; Rm 8.17). Os que são chamados são candidatos ao céu, são príncipes em todas as terras, embora príncipes disfarçados (SI 45.16).
Por fim, é um chamado superior porque é um chamado imutável, "porque os dons e a vocação de Deus são irrevogáveis" (Rm 11.29), isto é, aqueles dons que fluem da eleição (como a vocação e a justificação) são irrevogáveis. Deus se arrependeu de ter chamado Saul para ser um rei, mas nunca se arrepende de chamar um pecador para ser um santo.