Nada é mais tentador e
sutil do que desejar usar o poder de Deus para nossos próprios fins, de
controlar Deus de alguma forma. Essa é a essência do que é a religião. E
infelizmente, a quase totalidade do que chamamos cristianismo hoje.
Foi anunciado um quinto
filme de Indiana Jones... o que me levou a lembrar dessa série de filmes. No
primeiro filme da série, em 1981, em tinha 11 anos... e ele foi um dos meus
heróis favoritos na infância.
Ele era um professor universitário de arqueologia
aborrecido... um caçador de tesouros... mas não por dinheiro, ele tinha um lema
“Isso deve pertencer ao museu”.
Mas quando eu assisti
de novo o primeiro filme agora, depois do anúncio do quinto filme – Os caçadores
da Arca perdida – agora, como adulto, o
filme pareceu muito diferente de como eu me lembrava. Mudei eu, ou mudou o
filme?
Cheguei a conclusão de
que nostalgia quase sempre é enganosa.
Eu não sou o único a ficar
um pouco “decepcionado” ao rever os Caçadores da Arca perdida. Em 2013, o
sitcom Big Bang Theory teve um episódio inteiro dedicado a um
problema na história deslumbrante do filme. Em suas palavras: "Sem Indiana
Jones , os nazistas teriam encontrado a Arca e todos morreriam de qualquer
maneira". Isso circulou na Internet como a teoria que "arruinou os Caçadores da Arca Perdida para sempre." Em um gênero de filme que
é suposto ser sobre um herói vencendo os maus e frustrando seus planos, Indiana
Jones simplesmente não faz nada para
afetar o resultado da trama. Sem ele o resultado teria sido o mesmo.
Esta inação de Jones é mostrada
de maneira mais clara no final do filme, quando a Arca é finalmente aberta. Que
tipo de filme de ação tem o personagem principal que não faz absolutamente nada no final do filme? Ele só fica lá e fecha os
olhos. Todos os antagonistas do filme são eliminados em uma cena onde o
personagem principal está amarrado a um poste.
Esta história é
horrível para um mundo obcecado com o gênero super-herói. Este não é o herói
que queremos. Queremos uma luta final entre o bem e o mal. Queremos que nossos
heróis ajam decisivamente - Queremos que eles façam
algo, caramba!
Mas, pensando bem, ao
ver Indiana Jones novamente, comecei a perceber que talvez haja algo mais
profundo acontecendo do que apenas histórias pobres. Talvez haja algo mais na
inação de Indiana Jones .
Ao longo do filme, há
três grupos à procura da Arca: os nazistas, Belloq (René Emile Belloq é um
arqueólogo francês rival de Indiana Jones. Como Jones, Belloq percorre o mundo
em busca de antiguidades, mas prefere vendê-las para seu próprio lucro em vez
de entregá-las a um museu como faz Indy.) e Indy.
Os nazistas esperam
encontrar a arca e possuir um poder incrível. Eles acham que a Arca pode conter
algo misterioso e poderoso que os fará vencer a II Guerra Mundial, e eles estão
confiantes de que esse poder pode ser controlado e usado para seu próprio ganho
e propósito.
Belloq está aparentemente
junto com os nazistas, mas tem suas próprias razões para encontrar a Arca, ele
diz a Indiana em um ponto: " Jones , você percebe o que é a Arca? É um
transmissor. É um rádio para falar com Deus. E está ao meu alcance! "Na
mente de Belloq e dos nazistas, a Arca é algo que lhes dá poder e controle
supremos. Controlar o poder de Deus ( Muitas pessoas cultuam e oram com a mesma
ideia ).
Indiana Jones não é
muito melhor. Ele é um homem de ciência, um homem de razão. Ele e seu rival
Belloq são cortados do mesmo tecido, mas
Jones é apenas mais devotado à causa da ciência do que seu adversário.
Ele se envolve inicialmente para impedir os nazistas de adquirir a Arca, mas
ele também está nessa porque representa a chance de fazer parte de uma nova
descoberta científica.
No começo do filme, ele
descreve a Arca como "o que continha e carregava os dos Dez Mandamentos
... os Dez Mandamentos reais, as tábuas de pedra originais que Moisés tomou do
Monte " Mas na verdade, ele não acreditava nessas coisas de poder,
miraculoso...
Algumas cenas mais
tarde, quando seu amigo Marcus Brody o adverte para não tomar a arca assim
levianamente, ele condescendentemente responde: "Eu não acredito em magia,
um monte de supersticiosos. Eu estou indo atrás de um achado de significado
histórico incrível” – Mas não achava que havia algum poder associado aquilo.
No final desta jornada,
tudo o que Indiana Jones espera encontrar é um artefato que pertence a um museu
onde possa ser estudado e produzir novos insights históricos.
A falta de crença de
Jones está em exibição mesmo no final do filme junto com Belloq e os alemães:
ele ameaça explodir a Arca se eles não lhe entregarem Marion, (que haviam
capturado) mas Belloq apela para o lado
arqueólogo de Jones, para o forte desejo
de Jones em ver o conteúdo da Arca. Jones termina amarrado a um poste com
Marion porque ele quer estar lá para ver a Arca ser aberta tanto quanto os
nazistas e Belloq querem.
Desta forma, todos os
três grupos da busca agora estão no mesmo barco, por assim dizer. Indy, Belloq
e os nazistas, todos veem a Arca como algo para se possuir, algo para
controlar, e algo para promover seus próprios fins, planos e propósitos. Como
eu disse, como a maioria das pessoas nas igrejas de nossos dias pensam e agem. Nenhum deles vê na Arca algo Sagrado, Separado
ou Santo. Todos querem usar o sagrado para fins próprios – isso resume quase
todos os cultos que acontecem na igreja de nossos dias.
Mas todos nós sabemos
(provavelmente... se não, alerta de spoiler) No final do filme. Quando
finalmente eles abrem a Arca, os nazistas e Belloq são completamente
destruídos. Aqueles que esperavam usar o poder de Deus para si mesmos; Aqueles
que esperavam usar o “sagrado” (como exemplificado na Arca) para ajudar a si
mesmos e para seus próprios interesses - a ter o poder de Deus sob seu controle para governar o mundo ( suas circunstâncias – como é
tão comum ) foram aniquilados.
E quem ficou ali de pé,
com as cordas arrebentadas e agora liberto? Nosso herói: Indiana Jones, o herói que não fez nada, mas no último
momento e instante possível ele fechou os olhos.
Por que odiamos esse
fim? Acho que o resumo adequado e que está na raiz do problema de nossos
corações, é que, por mais que odiemos a Lei,
temos mais medo da graça.
Nós precisamos que nossas
histórias e fantasias mostrem uma
salvação heroica alcançada por méritos próprios. Apreciamos a oportunidade de
nos sentarmos e observar os triunfos da lei sobre a graça. Por quê?
Provavelmente porque é bom pensar que alguém ainda poderia fazê-lo, mesmo que
seja um super-herói mítico. Queremos ver os heróis fazerem o que sabemos no
fundo o que não podemos fazer. Nós queremos ser salvadores de nós mesmos e não
miseráveis salvos sem fazer nada, mas por graça soberana, pelos atos feitos
totalmente por Outro.
Nós não gostamos da
passividade de Indiana Jones porque queremos desesperadamente ter agência em
nossa própria salvação. Afinal de contas, ser um membro passivo do processo de
salvação não nos permite realmente estar no centro das atenções depois de tudo ser
feito e dito. Toda glória irá para Outro. Não há, "Eu fiz! Eu protegi a
Arca! " ( Nem: “Eu quis, eu usei meu ‘livre-arbítrio’ e outros não... se
não fosse o que eu fiz, eu não estaria salvo” ) No final do filme. Uma vez que
a Arca termina com seu julgamento sobre aqueles que ousaram pensar em usar
Deus, usar o poder de Deus para seus próprios fins, ela se fecha e fica selada - O
Deus da Arca decide que já foi o suficiente. A Arca é o personagem no controle,
não o “herói”.
E isso simplesmente não
nos satisfaz. Devemos ter controle sobre nossas vidas e sobre nossa salvação.
Nós prosperamos e alimentamos nosso orgulho assim. As Doutrinas da Graça
estragam tudo... Queremos contar a história em que nossa salvação teve nossa
participação. Nós odiamos a noção de um suposto “herói” que não faz
nada.
A realidade é esta, que
não somos diferentes de Indiana Jones. Que apesar de estar ali com Belloq e os
nazistas, apesar do fato de que ele estava nessa viagem em última instância
para seu próprio ganho e interesse, e apesar do fato de que ele estava amarrado
a um poste e não fazer nada – e que acabou amarrado no poste especificamente
porque ele queria ver o que havia na Arca tanto quanto eles, (Belloq e os
nazistas) - no final do filme, Jones é salvo sem fazer nada.
E só porque, diante de
seu julgamento justo, diante da ira divina, mostrou a deferência do temor – temor
a Algo maior que ele que faz tudo como quer e que não é controlado ou deve algo
a ninguém. Ele respondeu com “fé” à presença esmagadora do Santo. Ele deu o "Sim"
cego a Deus. Jones reconheceu que estava lidando com algo muito além de si
mesmo, que não pode ser usado pelo homem para seus próprios fins, e ele
simplesmente fez a única coisa que podia fazer para mostrar reconhecimento disso:
fechou os olhos. ( Sabemos que na história de nossas vidas, mesmo esse ato é um
dom de Deus ).
Desta forma, Jones não foi
muito diferente dos israelitas que pintaram sua porta com o sangue de um
cordeiro. Independentemente de serem bons israelitas ou ruins, ou de quão
seguros eles estavam de que este negócio da pintura funcionaria ou não, no
entanto, naquela noite, diante do julgamento de Deus, descobriram que seu papel
era confiar cegamente mesmo que “dúvidas” se levantassem - a fé era considerada
"suficiente". Se o Sangue estivesse na porta – a ira de Deus não os
atingiria naquela noite.
Queremos ser o herói
que realiza nossa própria salvação, mas ainda descobrimos que somos salvos do
julgamento simplesmente permanecendo ali de olhos fechados. Dando o
"sim" à obra consumada de Jesus. É a única coisa que Deus precisa
para salvar alguém. O reconhecimento da nossa miséria absoluta e total
impotência necessitando de uma salvação soberana quando merecemos apenas ira do
juízo divino. Isso é totalmente
contrário a mente natural do homem que é inimizade contra Deus – “Porquanto a
inclinação da carne é inimizade contra Deus, pois não é sujeita à lei de Deus,
nem, em verdade, o pode ser.” Romanos
8:7
Para homens assim, o homem
que fecha os olhos (como o Indiana) e grita “Miserável homem que eu sou! quem
me livrará do corpo desta morte? Rm 7:24
– tem que ser um dom de Deus: “Porque pela graça sois salvos, por meio da fé; e
isto não vem de vós, é dom de Deus.” Efésios 2:8
É a forma que Deus leva
um homem ao seu Filho: “Ninguém pode vir a mim, se o Pai que me enviou o não
trouxer” - João 6:44
E por essa razão, eu
acho que o final dos Caçadores da Arca
Perdida é um belo trabalho. Só posso ser
salvo como o Indy foi – o “herói” que
não fez nada. Então, pensando bem, depois de todos esses anos, ainda quero ser
como Indiana Jones, como queria ser quando
tinha 11 anos. Por motivos diferentes, mas ainda quero.







